segunda-feira, 2 de outubro de 2023

A repressão ao anarquismo na rússia soviética

 

por Anarquistas russos exilados na Alemanha

Tradução do francês por Dorothea Voegeli Passetti

Os anarquistas russos surpreenderam-se ao constatar, em 1917, que os bolchevistas, seus adversários de sempre,  voltaram  a  se  reencontrar  com  eles  para  pregar palavras de ordem libertárias como “todo o poder aos sovietes” ou “a terra aos camponeses, a fábrica ao operário”.

Daí a luta comum.

O primeiro divórcio ocorreu em outubro, na criação do “governo soviético”. Quando anunciado no II Congresso dos Sovietes, em outubro de 1917, Efim Yartchouk, delegado anarquista de Kronstadt, exclamou: “Que governo? Nós não necessitamos de  nenhum  governo!”, e ainda, quando do anúncio do “soviete dos comissários do povo”: “Que soviete dos comissários? Que invenção é esta? Todo o poder deve ir aos comissários locais!...”[2]. A continuação não fez senão aumentar essa divergência, que se transformou em um fosso quando houve o ataque das tropas tchekistas [3] contra as comunas e os clubes anarquistas de Moscou, Petrogrado e outras cidades, em abril de 1918, depois de um verdadeiro abismo criado em sequência a numerosas repressões governamentais exercidas contra os libertários de todas as tendências. Enquanto isso, os dissimulados do novo poder dividiam muito o movimento anarquista russo. Certos anarquistas, e não os menores nem os menos experientes, colaboraram com as autoridades oficiais, chegando a se aliarem à tcheka: Alexandre  Gay, que sempre foi seguro e inabalável em suas convicções, dirigiu a tcheka em uma cidade do Cáucaso;  um  certo  Samsonov,  anarquista emigrado aos Estados Unidos, antes de 1917, retornou para se ocuparmais tarde da “seção dos anarquistas” da tcheka, provavelmente em função de sua competência sobre o assunto.

Esse fenômeno é traduzido quantitativamente pela presença, em 1922, de 633 ex-anarquistas no seio do partido comunista russo [4]. Contudo, um bom número de libertários continuou consequente com suas convicções e foi objeto de contínuas perseguições do poder. Mostraremos dois exemplos significativos dessa repressão.

I. S. Bleikhman, operário funileiro tornado anarquista quando emigrou, volta para a Rússia à época do czar. É preso e deportado para a Sibéria. Libertado pela Revolução de Fevereiro, torna-se muito popular entre os operários de Petrogrado e os marinheiros de Kronstadt. É eleito ao soviete de Petrogrado e sua atividade lhe vale a perseguição de Kérensky. Ele de fato desempenha, com Efim Yartchouk,um eminente papel nas jornadas insurrecionais de julho de 1917. Depois de outubro ele é constantemente perseguido pelos bolchevistas, que o prendem em 1918 e o deportam para um campo de concentração, forçando-o a trabalhos humilhantes e penosos na lama e com a água até a cintura. Uma vez que já havia adoecido na prisão czarista, sua saúde agora se arruína e morre em 1921. “Porque teríamos necessidade de dinheiro — dizia I.S. Bleikhman — toda Petrogrado está nas mãos dos operários; todos os apartamentos, todas as lojas de roupas, todas as usinas e fábricas, as tecelagens, as lojas de comida, tudo está nas mãos das organizações sociais. A classe operária não necessita de dinheiro” [5].

Essa era uma língua que o novo poder não podia nem entender, nem tolerar.

O outro exemplo vem da feroz repressão submetida ao movimento makhnovista na Ucrânia, movimento insurrecional de camponeses pobres de tendência libertária, defendendo os sovietes livres e a livre organização das comunas autônomas. Em uma obra publicada há alguns anos na França com o título Memórias de um bolchevista-leninista [6], o autor relata:

“Os bandos de Makhno se abasteciam impunemente de armas nas cidades e vilas da região de Ekaterinoslav. Era impossível descobrir os esconderijos desses bandidos e de seus chefes. Os camponeses ricos simpatizavam comeles e os escondiam; o restante da população estava aterrorizado e não ousava revelar que eles os escondiam em suas casas.

Nosso comando e os soldados rasos estavam impacientes. Sob a iniciativa de nossos soldados, os órgãos locais da tcheka com os destacamentos da seção especial e lançaram ao trabalho. Um belo dia, eles detiveram e prenderam uma centena de reféns escolhidos entre a população abastada, comerciantes, kulaks [7], padres etc.

Após o interrogatório, foram levados ao pátio da prisão, e se exigiu que eles revelassem quem eram os chefes dobando, escondidos em algum lugar: em suas casas, em suas granjas e em outros esconderijos. Os reféns foram avisados de que se se recusassem a colaborar, vinte e cinco deles seriam fuzilados ali mesmo, como responsáveis por assassinatos e pilhagens.

Os reféns se calaram. Os vinte e cinco primeiros, por ordem alfabética, foram conduzidos a vinte passos e fuzilados diante dos outros.

No segundo dia a mesma coisa se repetiu. Os reféns silenciaram outra vez e, de novo, vinte e cinco foram fuzilados perante os olhos daqueles que sobraram. No terceiro dia, a mesma cena.

Quando, no quarto dia, os vinte e cinco reféns restantes foram levados ao pátio, disseram para eles que a coragem de seus amigos fuzilados certamente seria digna de louvor se tivessem permitido que pessoas boas e honestas pudessem escapar às perseguições, mas que eles escondiam os assassinos de soldados inocentes do exército vermelho, que vieram libertar o povo ucraniano dos proprietários fundiários czaristas e dos generais que espezinhavam os libertos do povo russo e ucraniano. Os reféns pediram um dia para pensar.

No dia seguinte a essa discussão, os reféns tiveram medo e deram os nomes dos chefes do bando de Makhno e de seus esconderijos na região. Verificou-se que esses chefes eram agentes de Makhno infiltrados nos órgãos do poder soviético e na direção local do partido: particularmente o presidente do soviete da cidade, o secretário do comitê da cidade do partido, que tinha reunido em torno de si os inimigos do poder soviético” [8].

Qualquer comentário se torna supérfluo. Assinalamos simplesmente que esse gênero de operação reproduziu-se em uma escala muito maior, com o propósito de acossar e exterminar os que estavam aliados por três vezes ao exército vermelho para combater e vencer os brancos.

Alexandre Skirda

As perseguições aos anarquistas pelo poder soviético começaram de determinada forma na primavera de 1918.

As causas fundamentais e gerais dessas perseguições foram suficientemente esclarecidas acima, e nos deteremos, portanto, apenas brevemente em seu histórico.

O crescimento rápido do sucesso do movimento anarquista irritava e assustava já havia algum tempo o partido comunista, que acabava de se instalar no poder. Não se sentindo suficientemente dono da situação e não tendo ainda conquistado completamente as massas, o novo poder não se decidia a passar para a ofensiva. Foi apenas após o tratado de Brest-Litovsk que sentiu o terreno firme e viu a possibilidade de agir com muitas chances de sucesso.

Levando-se em consideração que a revolução corria um perigo mortal e que necessitava de uma pausa para poder criar um exército revolucionário, o poder comunista conseguiu aterrorizar as massas, apoderar-se da vontade delas e submetê-las a sua própria, quando firmou o tratado Brest-Litovsk, em despeito de seus desejos claramente expressos de não assinar a paz com o imperialismo alemão e continuar a resistência revolucionária, única capaz de fazer triunfar a revolução.

O tratado Brest-Litovsk foi assim imposto ao povo trabalhador pelo poder comunista. Este pôde, dessa maneira, pela primeira vez, após uma longa e obstinada resistência dos operários e camponeses, submeter grandes massas laboriosas e constrangê-las à passividade.

Isto foi apenas um primeiro passo, o mais difícil. Tendo tomado a iniciativa da ação e transgredido impunemente a vontade das massas, o poder pôde sufocar a revolução. Em seguida foi-lhe fácil continuar nesse caminho, aterrorizando e submetendo mais e mais as massas, aumentando sua pressão sobre elas, para logo reduzir a revolução aos limites de sua ditadura.

Os anarquistas protestaram energicamente contra o tratado de Brest-Litovsk e a limitação das perspectivas revolucionárias, que desvirtuava o próprio sentido da revolução. O poder então resolveu desfechar um primeiro golpe decisivo aos anarquistas, aproveitando-se da passividade adquirida pelas massas e dispondo já de uma certa força militar organizada.

Sob uma ordem vinda de cima, a imprensa comunista começou a dirigir dia após dia uma campanha recheada de acusações mentirosas e de calúnias contra os anarquistas.  Um preparo sólido do terreno acontecia igualmente nas usinas, nas assembleias, nas unidades militares etc.

As disposições das massas também eram testadas na mesma ocasião. Pôde-se prever que o poder poderia contar com suas tropas e que as massas permaneceriam mais ou menos passivas. Finalmente, na noite de12 de abril de 1918, sob um pretexto absurdo e completamente inventado, as organizações anarquistas de Moscou foram atacadas, particularmente a Federação dos Grupos Anarquistas de Moscou. Esse ataque serviu de sinal aos posteriores proferidos contra as organizações anarquistas de toda a Rússia. Depois de ter preparado seu golpe e conduzido ele mesmo uma agitação infringida nos regimentos contra os “anarcobandidos”, Trotsky pôde proferir com satisfação sua famosa declaração: “Enfim o poder soviético varre o anarquismo da Rússia com uma vassoura de ferro”.

Entretanto, o poder ainda não tinha declarado ser a ideia de anarquismo fora da lei: as liberdades de palavra, de imprensa e de pensamento ainda não estavam definitivamente suprimidas. Ainda era possível existir por todo lado uma certa atividade libertária.

Os movimentos de protesto dos operários e camponeses contra os procedimentos terroristas, esboçados em 1918 e empregados contra eles pelo poder comunista, cresceram em 1919 e 1920. O poder, mais e mais cínico e despótico, respondeu com uma repressão obstinada e crescente, não parando frente a nada.

Os anarquistas, naturalmente, estavam de corpo e alma do lado das massas traídas e oprimidas que lutavam contra seus novos mestres.

Eles exigiam, com os operários e suas organizações profissionais, o direito destes conduzirem diretamente a produção.

Com os camponeses exigiam o direito de autoadministração e de manterem relações diretas com os operários. Com uns e outros exigiram a restituição de tudo que os trabalhadores haviam conquistado pela revolução e que o poder comunista lhes roubara: a restauração de uma ordem soviética livre, o restabelecimento das liberdades civis para as correntes revolucionárias...

Em uma palavra: exigiam a restituição das conquistas de Outubro ao próprio povo, por meio das organizações de operários e camponeses. Evidentemente, assim desvendavam a política criminosa do poder. Nisso residia a base da atividade revolucionária dos anarquistas e foi somente isso que serviu de fundamento para a declaração de uma guerra de morte ao anarquismo, e para declará-lo fora da lei.

Após o primeiro grande ataque aos anarquistas na primavera de 1918, as perseguições sucederam-se em uma cadeia ininterrupta, em toda a Rússia, durante os anos seguintes, caracterizando-se cada vez mais como desenfreadas e sem pudor.

Assim, ao final do mesmo ano de 1918, numerosas organizações anarquistas do interior foram outra vez atacadas. Das organizações que conseguiram se manter intactas, as autoridades tiraram toda possibilidade de ação.

Em 1919, ao mesmo tempo em que as perseguições contra os anarquistas na Rússia continuavam a todo vapor, começaram as repressões sistemáticas aos anarquistas da Ucrânia. Cidade após cidade, vilarejo após vilarejo, seus grupos eram liquidados, seus militantes presos, os jornais proibidos e as conferências suprimidas.

Durante o verão do mesmo ano, após a famosa ordem nº. 1824 de Trotsky, que declarou fora da lei o movimento makhnovista, anarquistas foram detidos e fuzilados ao mesmo tempo que os makhnovistas. E assim por diante...

Convém notar que na maioria dos casos os ataques às organizações anarquistas eram acompanhados de atos de extrema selvageria por parte dos tchekistas e de soldados vermelhos iludidos, loucos de raiva e de ódio: agressões brutais a camaradas detidos, destruição da literatura apreendida, demolição dos locais etc.

Fora essas repressões constantes e cotidianas, o poder comunista organizava de tempos em tempos ataques em grande escala aos anarquistas, semelhantes ao da primavera de 1918. Assim, no verão de 1920, aconteceu a destruição geral, na Ucrânia, das organizações anarquistas do Nabat [9].

No final de novembro de 1920, o poder comunista, obrigado a concluir, um pouco antes, um tratado de aliança com Makhno e a parar com as perseguições antianarquistas, retomou com toda a força sua repressão, fazendo deter em Kharkov a todos os anarquistas que vinham para participar de um congresso legal, e simultaneamente prendendo todos os anarquistas da Ucrânia, organizando uma verdadeira perseguição em meio a emboscadas e buscas, detendo até mesmo adolescentes de quatorze a dezesseis anos e tomando como reféns pais, mulheres e filhos. Para justificar esse comportamento, o poder antecipou seu rompimento com Makhno e inventou um “fantástico complô anarquista” contra o poder soviético [10].

Em março de 1921, durante as jornadas insurrecionais de Kronstadt, o poder procedia outra vez a detenções maciças de anarquistas (e de anarcossindicalistas), e os acossou de novo por toda a Rússia.

Todo movimento de massas — seja uma greve, uma manifestação de camponeses ou até um movimento dedes contentamento entre soldados ou marinheiros — produzia um efeito imediato sobre a sorte dos anarquistas.

Doravante, prendia-se qualquer um que cometesse o erro de partilhar ideias libertárias ou de ser parente ou conhecido de anarquistas. O simples fato de ter ideias anarquistas e de divulgá-las abertamente era com frequência o suficiente para alguém ser preso.

Em 1919 e 1921, as organizações de juventude libertárias foram desmanteladas. A operação de 1921 foi provocada pelo desejo de destruir na raiz a aspiração da juventude ao conhecimento dos fundamentos do ensino libertário.

No inverno de 1921, as organizações de anarquistas universalistas de Moscou são atacadas.

Na primavera de 1922, ocorrem novas detenções em massa de anarquistas em toda a Rússia.

Nossa lista de repressões está longe de se completar.

É possível afirmar, sem nenhum exagero, que durante esses últimos anos toda a Rússia revolucionária foi presa ou assassinada, e teve os anarquistas em primeiro lugar.

Nessas condições, a partir de 1919, foi-lhes impossível desenvolver a menor atividade: suas reuniões, conferências e congressos não puderam ocorrer. Sua imprensa foi sufocada. Toda tomada de posição pública tornou-se mesmo impensável.

De fato, o anarquismo, as ideias libertárias e a palavra livre foram declaradas fora da lei após 1919 [11].

Uma tal infâmia não poderia produzir-se sem provocar vivos protestos pessoais da parte de algumas individualidades fortes. Perto do final de 1919, Casimir Kovalévitch, operário das oficinas das ferrovias de Moscou, anarquista muito popular em seu bairro, lançou uma bomba em uma assembleia de dirigentes comunistas, em Moscou, na travessa Léontiev, com a ajuda de alguns camaradas [12]. Esse ato de protesto contra a ditadura bolchevista não provocou nenhuma tomada de consciência no partido dirigente.  Bem ao contrário, ele começou a perseguir os anarquistas e todos os revolucionários em geral com mais obstinação ainda, recorrendo aos mais escandalosos meios de fraude e de inquisição.

Se atualmente subsiste, na Rússia, uma atividade anarquista clandestina, e se essa atividade pode levar a atos de terror antigovernamental, convém entender que esses atos sempre aconteceram e inevitavelmente serão produzidos ali onde reinam o arbítrio e um monstruoso terror comandado do alto, ali onde todo pensamento é sufocado, toda palavra é proscrita e ali onde todo outro meio de luta é impossível.

Os horrores cometidos na Rússia começam, enfim, a saltar aos olhos dos que chegam ao país e se tornam pouco a pouco conhecidos além de suas fronteiras. Isto porque o poder comunista recorre a toda sorte de meios a fim de criar uma justificativa aos seus crimes.  Ele não para diante dos meios mais infames como, por exemplo, as “ciladas”.

Uma dessas ciladas tem como protagonistas Leon Tcherny e Fanya Baron [13].

No verão de 1921, um grupo de delegados anarquistas estrangeiros, vindos para o Congresso da Internacional Sindical Vermelha, interpelou o governo soviético sobre os anarquistas russos presos na Taganka [14], que faziam greve de fome para exigir sua liberação assim como a de todos os anarquistas presos. Como os delegados insistiam sobre a liberação destes anarquistas, Trotsky e outros representantes do poder lhes responderam: “São bandidos!”

Mesmo se o poder foi obrigado a soltar finalmente esses anarquistas e de expulsá-los para o estrangeiro, montou todo um caso para justificar frente aos operários estrangeiros sua tática terrorista a respeito deles, um processo baseado em uma cilada da tcheka, sobre delitos de direito comum relativos à fabricação de dinheiro falso, e que terminou por fuzilar dois dos mais honestos camaradas: Leon Tcherny e Fanya Baron.

Revelou-se que não somente os camaradas fuzilados eram inocentes desses delitos de direito comum, mas ainda que a ideia de imprimir dinheiro falso veio da tcheka de Moscou. Dois de seus agentes — Steiner (Kamenny) e um motorista tchekista — entraram em contato com os falsificadores e depois se infiltraram em um grupo anarquista, incitando-os a fazer dinheiro falso e a organizar expropriações. Tudo isso desenvolveu-se com a concordância da tcheka que, em seguida, graças a essa cilada, exigiu a vida dos libertários, manchando suas memórias [15].

Fonte: "Verve", no. 11:  95-108,  2007.

Notas

1 Traduzido do russo para o francês por Alexandre Skirda. Publicado em Berlim, em 1923.

2  S.  N.  K anev.  Oktiabrskaya  revoliutsia  I  Krakh  anarkhisma  [A  Revolução  de Outubro e a derrocada do anarquismo]. Moscou, 1974, p. 103.

3 Conforme Jacques Baynac, “em dois anos o câncer policial tomou conta da revolução. Apenas dois meses após o golpe de Estado bolchevista de 1917, foi promulgado o decreto — mantido secreto durante sete anos — que criou a Vetcheka (abreviação de Vserossiskaïa Tchesvytchainaia Komissia — Comissão Extraordinária Pan-russa). O mal progrediu tão rapidamente que, no segundo  aniversário  da  tomada  do  poder,  o  Pravda  diagnosticou  que  ‘todo  o poder aos soviets’ transformou-se em ‘todo o poder aos tchekas’. Uma década mais tarde, a doença tomou conta de tudo. Em 16 de dezembro de 1927, mais uma  vez  no  Pravda,  o  historiador  Pokrovsky  escreveu  que  a  polícia  secreta conserva a ‘essência da revolução proletária’, e que o terror é uma ‘consequência inevitável’.” Jacques Baynac (org. en collaboration avec Alexandre Skirda et  Charles  Urjewicz). La terreur sous Lénine. Paris, Le Sagittaire, 1975. (NT)

4 Idem, p. 383. O mesmo fenômeno vale para as outras organizações operárias e revolucionárias; bundistas mencheviques, socialistas-revolucionários de esquerda e outros. (Os bundistas formaram movimentos revolucionários judeus, criados no final do século XIX na Europa Oriental. NT).

5 Ibidem, pp. 261-262.

6  Paris,  1970.

7 Kulak é um termo soviético, identificando uma classe social de proprietários rurais russos e ucranianos, donos de fazendas que usavam trabalho assalariado em suas terras. Posteriormente, durante a coletivização stalinista de 1928 a 1932, os kulaks foram desapropriados em benefício dos kolkozes (cooperativas agrícolas), levando a deportações, prisões e à morte de 5 milhões de camponeses. (NT)

8 Op. cit., pp. 38-39.

9 Nabat foi um grupo anarquista ucraniano ligado aos makhnovistas, que também mantinha uma publicação com o mesmo nome. (NT)

10 Necessitando da cooperação do exército insurrecional revolucionário dos makhnovitas para lutar contra Wrangel, o poder bolchevista firmou um acordo com Makhno no início de outubro de 1920, acordo no qual uma cláusula estipulava que os anarquistas teriam liberdade e o direito de manter  uma atividade  militante  livre. Após a vitória contra Wrangel, o poder comunista atacou Makhno traiçoeiramente e ao mesmo tempo voltou-se, mais uma vez, contra o movimento anarquista da Ucrânia. Assinalamos a seguinte circunstância característica: alguns dias antes dessa nova repressão, uma vez que a escapatória de Wrangel parecia ser certa, a estação central da rádio de Moscou telegrafou a todas as estações de província a ordem governamental de desligar seus aparelhos, salvo para as estações centrais de Kharkov e da Criméia, que deveriam receber um telegrama secreto urgente. Um simpatizante anarquista, empregado em uma estação de província, não executou a ordem de desligamento. Interceptou o seguinte telegrama: “Estabelecer os efetivos dos anarquistas na Ucrânia, em particular na região makhnovista.  Lênin.” Alguns dias depois, quase na véspera da repressão, chegou um segundo telegrama nas mesmas condições: “Exercer uma  vigilância reforçada sobre todos os anarquistas e preparar os documentos, se possível de caráter de direito comum, utilizáveis para acusar. Manter os documentos e as ordens em segredo. Divulgar por toda parte as instruções necessárias.” Algumas horas mais tarde seguiu o terceiro e último telegrama, desta vez lacônico. “Deter todos os anarquistas e acusá-los.” Todos os telegramas eram endereçados ao presidente do soviete dos comissários do povo da Ucrânia, Rakovsky, assim como ao nome de outros representantes civis e militares do poder da Ucrânia. Após o terceiro telegrama, um dos camaradas, tendo conhecimento dos fatos, partiu a Krakhov para avisar os anarquistas locais sobre a ação que se preparava. Mas chegou tarde demais: a ação já havia ocorrido. Esse foi o chamado “complô” dos anarquistas ucranianos contra o poder soviético. O Barão Piotr Nikolayevich Wrangel foi o último general a comandar o Exército Branco contra as forças comunistas. Após o armistício da Rússia com a Polônia, em outubro de 1920, os soviéticos conseguiram juntar mais forças, fazendo com que ele recuasse para a Criméia e, em novembro, se retirasse com suas tropas para Constantinopla, dando fim à Guerra Civil Russa (NT).

11 Não podemos, nesta obra, ocuparmo-nos do exame de todas as razões que permitiram ao poder comunista destruir com certa facilidade (com exceção da Ucrânia) um movimento anarquista russo bastante forte. Isso nos distanciaria muito de nosso propósito. Limitamo-nos, pois, a dar aqui um breve esclarecimento do momento decisivo da paz de Brest-Litovsk e de suas consequências. A questão como um todo representa um tema particular, ao qual pretendemos consagrar um estudo específico.

12 Pode-se encontrar detalhes deste acontecimento assim como a identidade de seus participantes no famoso Livro vermelho da Tcheka, rapidamente retirado de circulação pelo próprio poder, pois, entre outros motivos, segundo as palavras do próprio Lênin, “Fala-se demasiadas verdades a propósito destes anarquistas”.

13 Sobre Fanya Baron ver adiante o artigo de Emma Goldman (NE).

14 Taganka, é uma prisão localizada em um bairro com o mesmo nome, no centro de Moscou (NT).

15 Segue uma lista de 182 nomes de anarquistas vítimas da tcheka. (NE da tradução  francesa  de  1975).