por Esther N.
A geografia chegou ao
fundo do poço.
Como se já não bastasse
a atroz mediocridade e contumaz inexpressividade que assolam há alguns anos a
geografia, desde que uma gangue de analfabetos tomou de assalto a corporação e
constituiu-se numa hegemonia política dominante, agora a geografia também poderá
vir a se tornar o covil universitário do neofascismo.
Isso porque uma de suas
tendências mais destacadas compõe aquilo que há de mais retrógrado, intransigente,
reacionário, boçal, obscuro e truculento na sociedade brasileira.
Completamente alinhada
ao atual e ilegítimo governo, tal tendência, representada no legislativo por
elementos que tiveram participação direta na deposição de um governo eleito
pela maioria eleitoral e, além disso, na aprovação da PEC 95, também chamada “PEC
da morte”, a qual congela gastos em saúde e educação por 20 anos, ocasionando, dentre
outras calamidades, corte em financiamento de pesquisa em ciência e tecnologia,
tal tendência não faz senão produzir ideologia rasa com ares de cientificidade.
O que se discute aqui
não é o mérito de pesquisas sobre temas dos quais há muito não se têm consenso na
comunidade científica. Mas o fato de dispor deliberadamente a pesquisa, paga
com dinheiro público, a serviço do mercado, do monopólio de mídia, do
agronegócio e, principalmente, dos interesses das grandes corporações
internacionais.
Mas não para por aí.
Afinada a uma agenda política de discriminação a indígenas, mulheres, negros, comunidade
LGBT e outras “minorias”; de alimentar um discurso de ódio; de patrulhar ideologicamente as escolas; e de defender abertamente a internacionalização da
Amazônia; essa tendência, se vier a se consolidar, acabará de uma vez por todas
com as raquíticas pretensões da geografia em algum dia reconquistar novamente o
respeito entre as demais áreas do conhecimento.
O jornalista Fernando
Brito, do blog Tijolaço, foi muito feliz ao comparar as chamas do Museu
Nacional ao incêndio atribuído aos nazistas do Reichstag. (Na verdade, não
foram os nazistas que atearam fogo no parlamento alemão, mas o fato alavancou a
chegada de Hitler ao poder). Não menos criminoso, a destruição do Museu
Nacional demonstrou o completo descaso, por parte do referido grupo político, a cultura, memória, educação e
ciência, sem precedente na história, a não ser em tempos de guerra.
Ninguém melhor caracterizou
o fascismo que um fascista: o famigerado general Milan Astray. Conta-se que,
durante uma cerimônia na Universidade de Salamanca, aos gritos, Astray deixou
registrado para sempre a marca indelével do fascismo: “Abaixo a inteligência!
Viva a morte!”
Numa paródia do mau
gosto, um ministro do atual governo brasileiro chegou mesmo a declarar, em
atitude de zombaria aos pesquisadores, professores, estudantes e sociedade, o seguinte,
sobre as ruínas do museu: “Tem muita viúva chorando”.
Neste particular, as
classes dominantes brasileiras e seus títeres inescrupulosos foram muito mais
perspicazes que os pelotões da SA e aprenderam muito melhor a lição do general
franquista. Afinal, para que cultura se o povo se contenta com futebol, funk,
sertanojo (não se trata, obviamente, da música sertaneja de raiz) e outros
lixos da indústria do entretenimento?
Sendo uma geógrafa
desencantada, eu me pergunto: serão estes os algozes que atearão fogo no acervo
que restou do passado da geografia?
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