quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

ATUALIDADE DA GEOGRAFIA

Atualidade da geografia

Em pleno século XXI, a geografia ainda é uma ciência atual? Este ensaio busca contribuir no debater da atualidade da geografia

Atualidade da geografia visa discutir a relação entre a geografia e a modernidade e sua introdução no conhecimento científico. A análise da temática parte do pressuposto que o conhecimento geográfico se situa numa tradição pré-moderna (renascentista) e não pôde, pela própria natureza de sua gênese, transpor as fronteiras da ciência propriamente dita. Desse modo, a divisão do trabalho científico em diferentes níveis de especialização torna-se incompatível com o caráter de ciência de síntese proclamado pela geografia. A atualidade da geografia reside justamente em sua resistência a um método e à pretensão ao estatuto de ciência. Portanto, a geografia deve estudar as relações entre sociedades humanas e natureza de forma livre, ametódica e holística, abrindo, assim, um espaço cada vez maior à estética. 

Autor: Jean Pires de Azevedo Gonçalves

INTRODUÇÃO

Há algumas décadas, o geógrafo francês Yves Lacoste indagou a que fim servia, afinal, a geografia. Talvez, numa tentativa de resgatar a dignidade desta ciência, respondeu que a geografia, em primeiro lugar, está a serviço da guerra, em seu contundente livro de título homônimo[1]. Lacoste argumentava que a geografia acadêmica, destinada a formar professores, era chata, enfadonha, monótona e parecia mesmo completamente inútil; sendo ainda matéria de verdadeiro terror de estudantes secundaristas, obrigados a decorar nomes incontáveis de afluentes de tal rio, montanhas, capitais de estados, províncias etc. etc. etc. Entendia Lacoste que, desde a expansão do nazismo e sua derrocada, a geografia francesa excluíra a geopolítica de seus temas e ensaiou alçar, através de uma vertente regionalista de cariz abertamente la blachiano, à condição de ciência neutra e imparcial, sob a égide do saber pelo saber. Todavia, por clara negligência epistemológica, a geografia era incapaz de definir claramente seus pressupostos científicos, limitando-se a enumerações intermináveis de fenômenos físicos e demográficos, tendo, inclusive, sua reputação de ciência severamente questionada por cientistas de outras áreas do conhecimento. Para Lacoste, a aversão causada por esta geografia acadêmica mistificava o verdadeiro conteúdo da geografia (tradicional), mais antiga e denominada, por ele, de geografia fundamental. Conforme sentenciou o geógrafo francês, este conteúdo, tácita ou ostensivamente ignorado, é o de saber agir espacialmente, através da leitura de cartas, mapas e escalas, e, por conseguinte, elaborar táticas e estratégias, visando obviamente objetivos de ordem política. Em consonância ao movimento de renovação da geografia, o livro de Lacoste foi seminal e desencadeou um fecundo movimento crítico, interno à geografia brasileira, que, ao que parece, pode ter chegado ao fim[2].
Quase 40 anos depois, a pergunta sugerida no livro continua atual, porém, sua resposta – “a geografia serve para fazer a guerra” –, equivocada. Os anos passaram revelando que o geógrafo não é assim tão imprescindível aos assuntos de Estado quanto pensava Lacoste (vide o mercado de trabalho, a geografia, no geral, continua formando professores). E isso é ainda mais constatável quando, em tempos de GPS, Internet, Google Earth, Googe Map etc., a técnica substitui o trabalho do geógrafo – outro tema antigo na geografia.
Feitas estas considerações iniciais, talvez aqui seja o momento apropriado para relatar um episódio que teve palco na Universidade de São Paulo, do qual presenciamos, e que parece vir de encontro ao que foi descrito acima. Numa destas ocasiões de defesa de tese de doutoramento, um dos avaliadores da banca julgadora, um arquiteto, chamou a atenção, no texto examinado, para o conceito de “inércia geográfica”, e exclamou, em tom jocoso, se não era a própria geografia que vivia uma inércia geográfica, depois de tanto barulho nos anos 80. Pois bem, passada a efervescência da Geografia Crítica, a geografia não teria retomado seu sono profundo de cem anos de bela adormecida à espera (em vão?) de um príncipe encantado?
Sono que se manifesta na necessidade quase obsessiva da geografia em se reafirmar como uma ciência. De fato, é bastante comum encontrar estudantes de geografia ou mesmo geógrafos justificarem a importância da geografia frente às outras ciências. Situação por vezes muito embaraçosa, quase como um pedido desculpa, uma licença para existir. Esta necessidade, à qual poderíamos chamar de vontade de ciência, entretanto, perpassa por toda a história da geografia moderna. Para isso, a geografia fez apologia de uma suposta unidade metodológica, tão delirante quanto infundada, dada a sua própria constituição heterogênea. A propósito, a definição de seu objeto – a superfície da terra – impossibilitava qualquer coesão de método ou delimitação de um saber especializado, gerando inevitáveis dualismos: geografia humana ou geografia físicadeterminismo ou possibilismogeografia geral ou geografia regional etc.

CIÊNCIA E GEOGRAFIA

Dentre estes dualismos, a geografia titubeia em fixar seu nascimento, ora remontando, temerariamente, à Antiguidade (por vezes, até à pré-história!); ora, na esteira das ciências, à Modernidade. Não é difícil perceber os graves problemas teóricos que daí decorre. Quanto à primeira tese, inventa-se uma tradição de pensamento independente da realidade histórica correspondente. Chamaremos a esta geografia difusa de pré-moderna. Quanto à segunda, na qual se poderia identificar uma ciência geográfica, perde-se na indefinição acerca da jurisdição de um objeto de estudo.  De acordo com Richard Hartshorne:

A limitação formal do campo da Geografia à crosta externa é de origem relativamente recente. Enquanto não existiu uma separação geralmente reconhecida entre Astronomia e a Geografia, perdurou até o século XVIII quando uma e outra eram incluídas na denominação de “Cosmografia” – não se procurou estabelecer uma precisa delimitação entre as duas disciplinas. Presume-se que o último erudito de alta categoria que as considerou como parte de uma só matéria foi Alexandre Von Humboldt. (HARTSHORNE, 1969).

No contexto renascentista, a cosmografia moderna herdou da tradição do pensamento antigo suas aspirações enciclopedistas. Além de não distinguir, como afirma Hartshorne, a astronomia da geografia, tampouco diferia da astrologia, que, aliás, separou-se da astronomia somente no século XVII. Por isso, não devia ser estranho a um cosmógrafo, como de fato não o era, consultar o horóscopo em suas previsões; serviço que foi constantemente solicitado por reis, rainhas e demais elementos da nobreza. Porém, as semelhanças param aí, pois a cosmografia moderna atendia aos interesses econômicos do Estado absolutista, artífice da expansão do capital comercial. De fato, a cosmografia foi largamente utilizada durante o período das grandes navegações e o cargo de cosmógrafo real foi imprescindível na aventura colonialista. Sob este contexto, quando, no século XVIII, as viagens e as expedições científicas procediam à catalogação minuciosa de um “mundo exótico” ultramarino, apenas preparavam o terreno para – nos dizeres de Max Weber – a autonomização das esferas de valor ou o desencantamento do mundo. Mas até os séculos XVI e XVII, os bestiários e herbários, dos primeiros naturalistas, apesar de ricamente ilustrados, eram pouco confiáveis, sendo antes uma mistura de mito, folclore e realidade, com suas histórias fantásticas de seres bizarros e imaginários. Estes aspectos desconcertantes do ponto de vista científico, no entanto, raramente são mencionados quando se presta tributo ao passado da geografia pré-moderna. Seja como for, os esforços notáveis de uma dinastia como a ptolomaica em reunir numa só biblioteca todos os livros do mundo, a célebre Biblioteca de Alexandria – ou o sonho borgiano da “Biblioteca de Babel”! –, ou a pretensão de reescrever o grande “livro aberto da natureza”, por uma única ciência, denotam um profundo desacordo aos rumos da ciência moderna. A ciência tal como a conhecemos não é uma continuidade da tradição do pensamento humanista mas, uma ruptura, e data historicamente do século XVII, com a denominada “revolução galileana”.
Depois de Galileu Galilei, o universo ptolomaico (geocêntrica) – uma pilastra da geografia pré-moderna – dá lugar definitivamente ao heliocentrismo copernicano, e a nova visão de mundo suscitada é ao mesmo tempo um reflexo de mudanças estruturais que operam em toda sociedade ocidental. Realmente, a concepção teleológica de Aristóteles, baseada na observação, na classificação e na lógica não constitui por si só o método científico, caracterizado antes pela experimentação. A metodologia científica demanda objetividade, por meio de experiências controladas, verificáveis e passíveis de serem reproduzidas, buscando-se assim descobrir regularidades subjacentes aos fenômenos aparentemente caóticos da natureza[3] e, se possível, estabelecer leis naturais. Obviamente, esta revolução, no nível simbólico, estava em consonância aos anseios da burguesia emergente. De fato, a exigência de se demonstrar a verdade de uma proposição, tal qual à maneira dos geômetras, associada ao uso objetivo da técnica (instrumentos), confrontava-se diretamente com o saber escolástico que legitimava a ordem feudal e o direito divino dos reis. Desde a Idade Média, porém, a classe dos comerciantes, onerada pelos encargos locais e, ao mesmo tempo, à medida que ganhava força, passou a reivindicar leis gerais e tratados internacionais que garantissem a segurança do comércio, bem como a unificação de moedas e a padronização rigorosa de pesos e medidas (no que se refere à cunhagem e pureza das moedas em circulação). Deste modo, a ênfase social nas relações práticas e quantitativas (racionalismo) se ajustava à nova mentalidade ao refletir as transformações radicais protagonizadas pela classe burguesa em sua ascensão ao posto de classe dominante. O conhecimento deveria então se adequar a uma divisão de trabalho cada vez mais especializada e, daí, fragmentar-se.

AS CIÊNCIAS HUMANAS E A ANTROPOGEOGRAFIA

            Com a emergência da sociedade industrial e as relações conflituosas nascidas do seio da divisão do trabalho, às humanidades, no século XIX, ser-lhes-á concedido o direito de ciência, não livre de desconfianças e dificuldades, inclusive de ordem moral, como, por exemplo, o da questão de se realizar o método experimental em seres humanos. O positivismo, de Auguste Comte, que propriamente não elaborou nenhuma filosofia nova senão um comentário apologético das ciências, surge como uma doutrina de amplo alcance ao conceber a noção de que o conhecimento positivo devia abranger desde a forma mais simples de ciência (matemática) até a mais complexa (sociologia). Apesar da posição privilegiada que ocupa a sociologia no sistema comteano, esta é compreendida, entretanto, como uma Física Social, à maneira da mecânica, e determinada por leis estáticas (ordem) e dinâmicas (progresso). Friedrich Ratzel, com sua Antropogeografia (geografia humana), introduz a geografia nas ciências humanas através das portas deixadas abertas pelo positivismo e à revelia desta doutrina, cujo estudo do espaço social estava incumbido também à sociologia. (Ver a esse respeito a polêmica entre a morfologia social de Durkheim e Mauss e a geografia, em Lucien Febvre). Em todo caso, Ratzel vai conciliar o naturalismo positivista à tradição romântica e historicista e fundar a geografia humana sobre os alicerces do conceito de território.
As ciências humanas ainda seriam obrigadas a muitas concessões às ciências naturais (exatas e biológicas), sempre sujeitas a recaídas. Foi, no entanto, a geográfica que arcou com o ônus mais penoso. Caberia à geografia a difícil tarefa de amalgamar, no processo da divisão do trabalho científico, naturalismo e humanismo. Ironicamente, a adesão da geografia ao positivismo (e num grau mais elevado, às ciências em geral) significava a perda de sua vocação de ciência holística e inaugurava seu campo epistêmico numa zona imprecisa e recusada pelo modus operandi da própria ciência. Ou seja, o dilaceramento provocado por tal comprometimento engendrou uma epistemologia esquizofrênica, sintomaticamente alternada por surtos de mania de grandeza (“síndrome de Napoleão”) e por um irremediável complexo de inferioridade, e foi mesmo um verdadeiro tiro pela culatra para a geografia. Todavia, somente a geografia humana poderia aduzir a tão sonhada unidade metodológica. Surgem enfim os “paradigmas” da geografia.

A TEORIA DO PARADIGMA CIENTÍFICO NA GEOGRAFIA

            A noção de paradigma se vulgarizou tanto que a imprecisão surgida de seu abuso desautoriza justamente seu uso sem algumas considerações relativas. O termo paradigma foi tomado de empréstimo da linguística e popularizado por Thomas S. Kuhn (1982), em seu influente livro As estruturas das revoluções científicas. Neste livro, Kuhn abre mão do conceito tal como foi proposto pelos linguistas, mas aceita, por analogia, e aplica à história da ciência, a noção de padronização (de teorias científicas) que admite certa flexibilidade desde que não se altere seu “núcleo duro” (radical). Estes paradigmas teóricos são adotados pela comunidade científica majoritária e representam a vitória de uma teoria sobre as demais concorrentes. Por isso, a teoria dos paradigmas científicos rejeita a ideia de evolução linear e gradativa na história da ciência. Na verdade, Kuhn afirma que o progresso científico transcorreu marcado por rupturas e descontinuidades radicais, as chamadas revoluções científicas. (“Revolução” tem aqui o mesmo sentido que comumente recebe nas ciências políticas). Assim, o desenvolvimento da ciência poderia ser descrito da seguinte maneira: Durante uma etapa inicial, pré-paradigmática, muitas teorias competem entre si para responder satisfatoriamente a um tipo de problema. A teoria vencedora, isto é, aquela que obtém temporariamente mais sucesso em suas explicações, tornar-se-á um paradigma científico (padrão de pesquisa) – o que não significa precisão, que, conforme argumenta Kuhn, nunca poderá ser alcançada. A partir daí, o paradigma aceito orientará a comunidade científica, através de um conjunto de suposições, regras e método previamente estipulados, na resolução de problemas típicos da assim chamada “ciência normal”. Neste sentido, a praxe científica é extremamente conservadora, chegando mesmo a desestimular iniciativas que visam a descoberta e, conforme assevera Kuhn, os cientistas sequer têm consciência de todas as regras pressupostas num paradigma quando realizam a sua pesquisa, pois foram inculcados a realizar cegamente operações reprodutoras nos anos de sua formação acadêmica. Contudo, durante a pesquisa, anomalias aparecem em decorrência dos limites do paradigma e são postas de lado como “dados” e, por fim, descartadas. Acontece que alguns cientistas concentram seus estudos nestas anomalias, porém, suas pesquisas são completamente ignoradas ou simplesmente interditadas por não seguirem a ortodoxia ditada pelo paradigma admitido. Isso pode levar muito tempo, até que o paradigma entra em crise por não dar conta do conjunto crescente de anomalias que nascem da própria pesquisa. Então, novamente muitas teorias entram em jogo para resolver novos problemas, sendo que uma sairá vencedora e aceita pela comunidade científica.
            Embora Kuhn, para comprovar sua tese, ilustre com muitos exemplos o seu livro, entendemos que a noção de paradigma seria melhor empregada se se referisse a grandes teorias ou visões cosmológicas, como no caso da mecânica newtoniana, do espaço-tempo de Einstein ou da evolução das espécies de Darwin. As diversas correntes teóricas que perfariam uma ciência constituiriam antes subparadigmas de um paradigma. Em todo caso, Kuhn estende o processo acima descrito a todas as ciências, sejam elas as humanas, exatas ou biológicas. O que propomos agora é pensar a teoria dos paradigmas na geografia, e, mesmo conscientes dos riscos, afirmaremos que na história da geografia moderna subsistem apenas dois paradigmas e não mais que isso.

RATZEL E VIDAL DE LA BLACHE

Duas grandes concepções teóricas disputaram a hegemonia do saber geográfico no âmbito da ciência no fim do século XIX e início do XX, porém elas não estavam isentas de um projeto político cujas práticas buscavam legitimar por meio da razão científica. Curiosamente, a teoria vencedora, que se elevou à condição de paradigma, representou justamente o projeto nacional perdedor; no entanto, militava em defesa do modelo econômico vigente.
            Vimos que o ingresso da geografia ao rol das ciências humanas se deu através de Ratzel. Este geógrafo estava empenhado, como todos os de sua geração na Alemanha, na consolidação do Estado nacional alemão, recém-unificado. Na segunda metade do século XIX, a Alemanha, após a guerra franco-prussiana, emerge rapidamente como potência no cenário político europeu. Sua modernização foi promovida verticalmente, isto é, protagonizada por um Estado forte e centralizado, nos dizeres de Lênin, pela “via prussiana” de desenvolvimento capitalista. Tal progresso esteve intimamente associado a um caráter ostensivamente beligerante e a uma indústria de alta tecnologia. Diante dos dilemas do capitalismo monopolista, como a abertura de novos mercados, para solucionar o problema da crise de superprodução iminente, e, ao mesmo tempo, da busca de novas fontes de matéria-prima, o Segundo Reich, entretanto, saiu em larga desvantagem na partilha neocolonial. Para consumar suas aspirações imperialistas, o Estado alemão não rompeu com o modelo prussiano de economia política baseado no mercantilismo (cameralismo); pois o protecionismo apregoado por esta doutrina assegurava o desenvolvimento interno por que passavam algumas nações e que se chocava frontalmente como livre-comércio promovido pelo Império Britânico. Não é à toa, então, que práticas mercantilistas[4] encontraram força nas obras de um Johann G. Fichte ou de um Friedrich List[5], mas, principalmente, na influente “Escola Histórica de Economia”. Aliás, o prestígio da escola historicista e de autores como List ultrapassaram em muito as fronteiras germânicas e encontraram solo fértil num país como os EUA, que, assim como a Alemanha, rivalizava com a Inglaterra e perseguia sua própria “vocação” expansionista no continente americano (lembrando a viajem de Ratzel pelos Estados Unidos, não é de se admirar que o determinismo geográfico floresceu em geógrafos estadunidenses, como Ellen C. Semple). Ora, as bases pelas quais a riqueza de uma nação situa-se no espaço geográfico, na forma de matéria-prima ou recursos naturais, remontam, em essência, sem dúvida nenhuma, ao “metalismo”, para o qual o crescimento econômico advinha da acumulação de metais preciosos, como o ouro e a prata. É neste ambiente político e intelectual que Ratzel desenvolve a sua geografia humana, inaugurando a geografia política. Sua tese, aliás, é bastante original. Parte do princípio, contrariando as premissas liberais, de que quanto maior o grau de civilização de um povo, maior será sua dependência à natureza, pois suas relações se diversificam. Daí a importância que Ratzel concede ao solo, enquanto fonte de valor. O solo, como base da riqueza, filia-o também à escola fisiocrata de economia (excluída a máxima do laissez faire). Por isso, Ratzel retoma a tese malthusiana, segundo a qual a densidade demográfica está na ordem inversa do crescimento agrícola[6]. O crescimento populacional impele um Estado à busca de recursos naturais, ampliando e anexando territórios. A terra é o espólio na luta entre nações, e medida de poderio político. Para Ratzel, o Estado é um organismo que para subsistir precisa de seu espaço vital (território). Enfim, as concepções geográficas ratzelianas realmente se ajustavam às peculiaridades do capitalismo alemão, que aliava, lado a lado, uma burguesia ultraconservadora e a classe latifundiária dos “junkers”. Compôs também, mais tarde, o repertório eclético da ideologia nazista e, quando do término das catástrofes das duas grandes guerras, sua geopolítica estava definitivamente banida da geografia.
            Ao fim da II Guerra Mundial, a França saiu-se vitoriosa, porém, sua participação, de fato, não foi mais do que a de coadjuvante no conflito. Sua indústria, às vésperas da mencionada guerra franco-prussiana, era incipiente e, após a derrota para os alemães, a França não desempenhou senão que um papel menor no cenário europeu, muito distante dos tempos gloriosos de um Rei Sol ou mesmo um Napoleão. A geografia francesa nasce no contexto de reconstrução do país, sem, no entanto, avançar muito além dos limites do liberalismo inglês. Seu grande nome foi Paul Vidal de la Blache que, em termos epistemológicos, não rompeu com a filosofia positivista, na medida em que imobilizava descrições minuciosas das regiões francesas como se fossem quadros de um saber acabado e, aparentemente, sua geografia não se opôs deliberadamente à de Ratzel, apesar das severas ressalvas. Daí o lugar que ocupa, em sua obra, a circulação, difusão e distribuição da espécie humana sobre a terra, compreendida teoricamente, à maneira ratzeliana, como um desenvolvimento analítico derivado dos estudos já bastantes maduros da botânica e a zoogeografia. Porém, Vidal, historiador de formação, confere grande importância ao fator social nos estudos geográficos. Diante das intempéries da natureza, a sociedade humana produz instrumentos que tendem a suprir suas fragilidades, ou seja, o ser humano trabalha a matéria natural em proveito próprio, transformando a natureza, através de um processo adaptativo, que abarca desde hábitos alimentares específicos à construção de habitações etc. Ao adaptar-se a condições variadas no planeta, cada sociedade produz uma realidade diversificada etnograficamente, da qual se debruça a análise da geografia, identificando-se daí um determinado de gênero de vida.

O homem cinzela e amolda a matéria bruta; comunica à pedra e aos metais as formas plásticas que lhe convêm; mas relativamente às espécies vivas, sobretudo quando se trata das plantas anuais mais sensíveis e mais submetidas ao cuidado vigilante, ele faz mais. Cada momento da evolução daquelas oferece-lhe a oportunidade de intervir; e daí, penetrando, por assim dizer, na intimidade do seu ser, identificando-se com elas, consegue modificar numa certa medida as operações sucessivas dos seus ciclos de existência. (LA BLACHE, 1954, p. 213).
  
            O conceito vidalino fundamental para descrever a relação entre sociedade e natureza é o de humanização do mundo. A atividade humana consiste em produzir um ambiente favorável a sua existência. “Obedecendo aos seus impulsos e aos gostos próprios, humanizou, para seu uso, a natureza ambiente; e assim vemos, em graus diversos, uma série de desenvolvimentos originais” (idem, p.276). Pode se dizer que esta dinâmica simbiótica intensifica-se conforme o grau de civilização de uma comunidade ou nação, produzindo mudanças significativas na paisagem, produzindo uma paisagem humana (cultural):

Assim, pelo princípio de combinações, tanto o arranjo como a composição das paisagens foram modificadas. O homem reuniu à volta das suas habitações um conjunto compósito de arvores e plantas, enquanto, longe da periferia habitada, dispunha de espaço para suas culturas. (Idem, p. 254).

            A capacidade humana de transformar a forma da matéria para seu uso só é possível pelo trabalho. “Em suma, realizou-se trabalho que representa outros tantos ensaios independentes para resolver em comunidade o problema da existência sob a pressão das influências geográficas” (idem, p. 175). Concluindo: “Os instrumentos que o homem colocou no trabalho, a serviço de sua concepção de existência, derivam de intenções e de esforços coordenados, em vista de um gênero de vida” (idem, p. 200).

DETERMINISMO X POSSIBILISMO

Foi preciso um historiador fascinado pelo humanismo do sáculo XVI para perceber a diferença crucial que estava por trás da geografia de Ratzel e la Blache. Sem dúvida, foi Lucien Febvre quem revelou o conteúdo implícito e fundamental que divide o cerne da geografia moderna ao consagrar os termos determinismo e possibilismo. Todavia, é ponto pacífico entre os geógrafos de que esta distinção tende a ser bastante redutora e não expressa as especificidades das obras destes dois fundadores da geografia humana. Não obstante, o antagonismo que diferencia os programas dos quais as duas geografias estão engajadas, como se mostrou acima, não só autoriza como justifica a demarcação de duas escolas no pensamento geográfico. Numa passagem exemplar de seu livro “La terre et l’évolutiuon humaine”, Febvre, ao descrever uma típica paisagem do mediterrâneo na Toscana, com suas “oliveiras, videiras e amoreiras”, desmistifica sua suposta “naturalidade” demonstrando como na verdade ela foi historicamente produzida, em meados do século XIII, para atender fins comerciais. “En réalité le paysage toscan est une creation humaine” (FEVBRE, 1979, p. 286 – desculpem-nos o francês). De fato, este historiador francês tem plena clareza, aos moldes iluministas e liberais, de que a noção de gênero de vida[7] pressupõe a condição geográfica enquanto condição de liberdade e desenvolvimento humano. Por isso, rejeita qualquer determinismo natural, como, por exemplo, a antiga asserção das condições climáticas influindo no caráter dos indivíduos, das raças, dos povos, das culturas, das nações etc.

Necessidades, em parte alguma; possibilidades, em tudo. O homem e não a terra, nem as influências do clima nem as condições determinadas dos lugares. (...) Temos dito e demonstrado. Tais concepções são ainda mais arbitrárias do que quando falamos em condicionamentos de grandes sociedades humanas pelas condições naturais, cuja análise geográfica tem nos revelado hoje em dia, face à realidade, tratar-se antes de transformação dos homens pelo trabalho humano. (Idem, p. 285, grifo nosso)[8].

            Esta passagem é fundamental e permite algumas reflexões teóricas que extrapolam à temática estritamente geográfica, pois o possibilismo inaugura, pela primeira vez na geografia, a noção de sujeito moderno. A esse respeito, Karl Marx vai escrever:

A essência subjetiva da propriedade, a propriedade privada enquanto atividade sendo para si, enquanto sujeito, enquanto pessoa, é o trabalho. (...) a essa economia nacional que descobriu a essência subjetiva da riqueza – no interior da propriedade privada – os partidários do sistema monetário e do sistema mercantilista, que sabem a propriedade privada enquanto uma essência somente objetiva para o homem. (MARX, p. 99).

Neste sentido, retomando o que se procurou defender até aqui, é possível estabelecer dois grandes paradigmas na geografia: o paradigma do espaço (político) e o paradigma da paisagem (trabalho).

MÉTODO E CRISE NO PARADIGMA DE GEOGRAFIA

O triunfo do possibilismo, na esteira da vitória dos Aliados, significava, por outro lado, e em um domínio mais amplo, a derrota da própria geografia. Assim, os compêndios e as monografias regionais, que, outrora, tanto serviram para o reconhecimento de características físicas e folclóricas (etnográficas) de um país e que, de certa forma, inspiravam sentimentos ufanistas, perdiam todo o sentido no interior do ideal de ciência neutra. Em que pese as diferenças paradigmáticas expostas acima, a definição de um método sempre foi muito problemática na ciência geografia. Simplesmente, a inviabilidade de pensar a superfície da terra enquanto um “objeto” científico é patente, dada sua extensão e ilimitada complexidade, não configurando assim proposta realista, pois, além do mais, caminha em sentido oposto ao conhecimento que tende a se fragmentar em especializações. Por isso, a geografia ora se afirmou como ciência auxiliar; ora, como ciência de síntese.
Diante de um objeto tão intangível, Pierre George descreve a metodologia em geografia como ciência que mobiliza os resultados de um grande número de outras ciências associadas em um dado conjunto espacial e conjuntural (GEORGE, 1972). Deste modo, o trabalho de campo constitui quesito indispensável ao expediente do geógrafo, muito mais relevante, inclusive, do que a consistência teórica concernente à identidade científica da geografia.

O documento geográfico é o resultado final da evolução de fatores que são os documentos ou objetos dos estudos de outras ciências. O geógrafo aplica métodos por ele elaborado durante a observação do visível e utiliza outros setores de pesquisa para analisar o invisível e reassume sua própria condição de geógrafo para construir uma imagem global do espaço feita de visível e invisível. (...) O visível por excelência é a paisagem, reconhecida como objeto essencial da curiosidade e do estudo geográfico. A paisagem é uma resultante de legados ou de forças atuais ou do passado as quais, em si mesmas, fogem do domínio do visível: são elas tantos as longas sequências de acontecimentos geológicos ou históricos, como os fluxos de capitais ou as redes de comando e de decisões ligadas às estruturas. (...) Entretanto, a paisagem só poderá ser qualificada e classificada numa tipologia geográfica se forem levados em conta todos os elementos invisíveis que lhe conferem sentido. (...) Estamos, por conseguinte, diante de dois temas: a mobilização dos documentos de natureza geográfica acessíveis à observação, e a utilização de documentos não geográficos para fins geográficos, visando à construção de imagens geográficas. (Idem, p. 22).

            Ou seja, caberia ao geógrafo sair a campo, recolher exaustivamente inúmeros elementos no terreno, delegá-los ao tratamento de outras ciências, para depois representá-los cartograficamente. É por isso que Nelson Werneck Sodré pôde escrever acertadamente: 

Cedo se verificou que, ao geógrafo, cabia conhecer a vegetação, sem ser botânico; o clima, sem ser meteorologista; as camadas terrestres, sem ser geólogo; os fenômenos físicos, sem ser físico; os químicos, sem ser químico. A isso se acrescentou a necessidade de conhecer História, sem ser historiador; Antropologia, pelo menos a cultural, sem ser antropólogo; e Sociologia, sem ser sociólogo, – uma vez era indispensável situar a o homem na paisagem e distinguir, ao longo do tempo, como se modificavam as suas relações com a natureza. (WERNECK, 1982, p. 8).  [Atualmente acrescentemos também: filosofar, sem ser filósofo].

Curiosamente, a geografia fragilizou-se onde mais buscava auferir forças: na autoproclamação de sua cientificidade. Em meio à incapacidade de se consolidar como ciência e obter reconhecimento de outras disciplinas, a geografia foi incapaz de questionar seus próprios fundamentos e a crise foi inevitável O sentido exato desta crise foi descrito em justa medida por Amélia Damiani na seguinte citação:

O que a geografia, neste final do século XIX, na França especialmente, busca é encontrar a identidade da humanidade do homem, produzida na relação homem-natureza. O que a devastação dessa economia acumulativa capitalista nos assegura tentar decifrar, hoje, é um enorme processo de desumanização. (DAMIANI, 2005, p. 60).  
           
            Enfim, o possibilismo nada mais fez que substituir o determinismo natural pelo determinismo econômico. Antes de ser um problema metodológico ou do objeto, a crise da geografia se manifestava nestes termos expressos na citação acima, mas a tentativa de salvá-la não poderia ser mais catastrófica, pois não rompeu com o conteúdo inumano da dialética do iluminismo.

ESPAÇO: OBJETO DA GEOGRAFIA?

A crítica à geografia tradicional impôs a tarefa imperiosa da renovação da geografia, principalmente, quanto àquilo que dizia respeito às suas deficiências, ou seja, coerência e unidade epistêmica, mas, acima de tudo, enquadramento ideológico. Exigiu-se, em primeiro lugar, a definição, nos moldes positivistas, de um objeto de estudo “palpável” que desse consistência a um sistema categorial próprio da geografia e que, ao mesmo tempo, lhe imputasse credibilidade científica. O modelo exemplar deveria provir, obviamente, das ciências exatas, isto é, da tradição racionalista, por meio de uma versão asséptica, neutra, imparcial do espaço (econômico). Sendo assim, a concepção de um espaço abstrato deveria encarnar a noção de sistema e totalidade. O que significava metodologicamente partir de um primeiro postulado ou de uma unidade arquetípica (no caso, o espaço), pelo qual, em tese, já deveria conter em si tudo (pois é totalidade), e daí deduzir toda a realidade sem inferir mais nada além, para finalmente voltar ao ponto de partida ideal (o espaço). Neste sentido idealista, toda a realidade concreta é subsumida a um conjunto de variáveis de um sistema pretensamente operacional e isento de interesses particulares. Não obstante, o espaço assim concebido atendia a fins políticos e de planejamento subordinados sempre à lógica econômica. Sua neutralidade é uma falácia.
             Mais uma vez teria a geografia de se ajoelhar aos pés das ciências exatas! Pois, a concepção de sistema circular e fechado, compreendido como processo de auto-regulação, que tende ao equilíbrio, ao fazer analogia da máquina ao organismo, entrou em voga na primeira metade do século XX, com uma arquitetura de ambições utópicas e alguns ramos das ciências biológicas e da matemática[9]. A teoria geral dos sistemas (TGS), a cibernética e a teoria dos sistemas complexos (ou teoria do caos) são quase ciências trigêmeas e, longe de representarem um rompimento com a ciência tradicional, fincam suas raízes num terreno extremamente conservador, porque perseguem padrões e regularidades subjacentes não somente aos fenômenos caóticos da natureza mas também aos da sociedade, advogando um fundamento comum para todas as ciências (humanas, biológicas e exatas).
Aliás, é difícil traçar uma fronteira precisa entre a TGS e a cibernética, porém, o conceito que as une é o de entropia negativa – isto é, sistema de conversão de energia dissipada em trabalho. De fato, com o desenvolvimento tecnológico, não demorou muito para que alguns pesquisadores traçassem uma correspondência de certos tipos de mecanismos “inteligentes”, como o termostato, a seres vivos. No livro de divulgação da teoria que desenvolveu – “Cibernética e sociedade: o uso humano de seres humanos” (primeira edição de 1950) –, o matemático do M.T.I Norbert  Wiener procurou em linhas gerais descrever suas teses:

A tese deste livro é a de que a sociedade só pode ser compreendida através de um estudo de mensagens e das facilidades de comunicação de que disponha; e de que, no futuro desenvolvimento dessas mensagens e facilidades de comunicação, as mensagens entre o homem e as máquinas, entre as máquinas e o homem, e entre a máquina e a máquina, estão destinadas a desempenhar papel cada vez mais importante. (WIENER, 1968, p.16).  

De acordo com a cibernética, máquinas complexas ou autômatos não seriam apenas análogos a organismos, mas também a sociedade, aos quais estariam sujeitos às mesmas leis matemáticas. Tais leis estipulam que sistemas regulatórios, capazes de organizar coisas e gerar informação, podem apresentar um ou mais circuitos de comutação, o que possibilita troca de “mensagens”, tendo em vista à ordenação de um meio que tende à desordem (entropia). Por isso, funções orgânicas, como o sistema nervoso central ou sanguíneo, ou, aspectos sociais, como a circulação de pessoas, mercadorias etc., são compreendidos obedecendo ao mesmo princípio de capacitores, resistores, válvulas, indutores e outros componentes ligados entre si por caminhos fechados e contínuos.

Isso foi formulado, entre outros, por Norbert Wiener há aproximadamente dez anos, mas não se pode negar que os rumos fundamentais desta hipótese remontam o problema da forma como conceberam Platão e Aristóteles. Os elementos de um sistema devem “comunicar-se” entre si, devem desenvolver inter-relações regulares e coerentes. Esta necessidade de comunicação é fundamental e igualmente importante para sistemas físicos, biológicos ou sociológicos. Sem comunicação não há ordem, sem ordem não há totalidade. Aqui o princípio básico pode ser considerado, por motivo de clareza (não por motivos lógicos), segundo dois aspectos. Em princípio lugar, segundo o problema da comutação. A pergunta que caberia aqui seria a seguinte: Qual são, no sentido da técnica, os princípios de comutação de sistemas complexos e de que forma podem ser responsáveis pela conduta destes sistemas? Sendo assim, as redes de comutação servem para transportar notícias,  sinais, numa palavra: informação. (WIESER, [1ª. Edição – 1959] 1972, p. 13).

            Foi talvez Milton Santos aquele quem melhor conciliou as duas principais tendências da renovação da geografia: o neopositivismo (geografia sistemática ou teorética) e marxismo (geografia crítica). A partir destas duas perspectivas e tomando o espaço enquanto produto da uma fusão entre meio geográfico e técnica, Santos articula a ideia de uma história do espaço.

No começo era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por objetos fabricados, por objetos técnicos, mecanizados e, depois, cibernéticos, fazendo com que natureza artificial tenda a funcionar como máquina. (SANTOS, 1996, p. 39).

            Do espaço natural chega-se ao espaço artificial, tal como vimos acima, isto é, análogo à máquina, inaugurando um tempo denominado de período tecnológico:

A técnica, esse intermediário entre a natureza e o homem desde os tempos mais inocentes da história, converteu-se no objeto de uma elaboração científica sofisticada que acabou por subverter as relações do homem com o meio, do homem com homem, do homem com as coisas, bem como a relações de classes sociais entre si e as relações entre as nações. (SANTOS, 2009, p. 16).

Ainda segundo Santos, no período tecnológico, as formas artificiais e coisas sociais – matéria trabalhada – adquirem autonomia em relação à sociedade, por fim, dominando-a. Esta analogia à máquina permitiu a Santos (1994) definir o espaço como sistema de objetos e sistema de ação, ou, mais precisamente, meio técnico-cientifico-informacional. Seu pressuposto parte de um sistema de ações (fluxos), expresso no trabalho e instrumentos de trabalho, que transforma o meio, cristalizando, através dos tempos, formas (fixos) que re-significam (função) as relações sociais. O sistema, que ganha dimensões próprias, é uma segunda natureza, tendo na sua forma mais acabada a cidade[10]. “Esse novo tema de estudo não é apenas útil para compreender o funcionamento da cidade como máquina viva, mas também para explicar, sob uma nova luz, as relações externas da cidade, seja com sua região de influência, seja com outras cidades” (SANTOS, p. 30).
            Esta concepção tecnicista é completamente fetichista e dissimula o aspecto fundamental da economia capitalista, que é o trabalho e a mais-valia, pois pressupõe um equilíbrio das trocas por circuitos de comutação. O espaço da técnica, como bem tem consciência Milton Santos, nada mais é do que expressão da reificação das relações humanas. Tomá-lo como objeto de estudo é reafirmar sua alienação. Aliás, Santos tinha perfeita clareza a esse respeito quando escreveu:

Devemos nos preparar para estabelecer os alicerces de um espaço verdadeiramente humano, de um espaço que possa unir os homens para e por seu trabalho, mas não para em seguida dividi-los em classes, exploradores e explorados; um espaço matéria-inerte que seja trabalhada pelo homem mas não se volte contra ele; um espaço Natureza social aberta à contemplação direta dos seres humanos, e não um fetiche; um espaço instrumento de reprodução da vida, e não uma mercadoria trabalhada por outra mercadoria, o homem fetichizado. (SANTOS, 2009, p.41).

            O espaço como organismo autônomo não é novidade na geografia, remonta, como vimos, a Ratzel e seu espaço vital, ou ao Estado, considerado um organismo em constante estado guerra com outros Estados, e que para subsistir deve invadir, espoliar, anexar e expandir o território.

GEOGRAFIA: UMA CIÊNCIA ATUAL?

O físico e filósofo Paul Feyerabend (1977) refuta, tal como Kuhn, a ideia de progresso cumulativo nas ciências, porém, vai mais longe. Demonstra, tendo na figura de Galileu seu exemplo mais ilustrativo, que o desenvolvimento científico pautado por uma metodologia normativa, racional e condicionada pela experimentação rigorosa não passa de uma construção a posteriori da história da ciência. Segundo Feyerabend, descobertas científicas se realizaram de modo muito pouco ortodoxo, no sentido do imaginário clássico da ciência. Na verdade, elementos irracionais, casuais, formulação de hipóteses ad hoc, recursos retóricos e até propagandistas também participam do repertório da investigação científica, embora escamoteados posteriormente pelo filtro do historiador da ciência. Enfim, o ideal de pureza do método é bem pouco realista quando se examina de perto a grande liberdade metodológica com que trabalha os grandes cientistas em suas descobertas; procedimento, aliás, bem pouco metódico e que mais se assemelha, de acordo com Feyerabend, a um “vale tudo” de idéias, um anarquismo epistemológico. Não obstante, a criação ideológica de um modelo infalível de racionalidade na ciência autoriza-a à condição totalitária de interlocutora exclusiva da sociedade. O corporativismo dos profissionais ligados à ciência também não admite outras visões de mundo não ocidentais e, obviamente, suas implicações políticas são das mais evidentes (e por vezes nefastas). Logo, a unidade de método não é senão um mito, chegando às raias do absurdo – para não dizer do ridículo – quando as ciências humanas copiam e imitam as ciências exatas acreditando na ilusão de que estas são, em última instância, as detentoras da verdade.
            Feitas estas breves considerações, apesar dos textos de geografia reivindicarem exaustivamente a definição do método geográfico, de sua identidade epistemológica etc., basta apenas uma observação superficial em sua prática de pesquisa na geografia para constatar que estas aspirações são meras quimeras. O próprio “objeto” da geografia apresenta, como vimos acima, problemas de limitação e não será por um decreto baixado pela vontade (de ciência) que se colocará termo na questão. Permita-nos contar mais dois episódios ocorridos à boca miúda na universidade e que bem podem ser interpretados como extraoficiais. Certa vez, um professor de um curso de geografia física comentou que a sua matéria poderia ser ministrada em qualquer outro departamento, como o de geologia, de oceanografia, de ciências da terra etc., e só não o era por motivos históricos e corporativos. E sabe, ele tem razão. Diante da dificuldade de pensar um tema de pesquisa, colegas afirmaram que qualquer temática era passível de ser estudado pela geografia, desde que se introduzisse um mapa nos anexos finais. E eles também têm razão. O mapa, na prática, é o selo de garantia de qualquer estudo como o de geografia, embora não é de hoje que a cartografia se dissociou da ciência geográfica como disciplina autônoma. De fato, estas opiniões expressam a realidade de pesquisa em geografia, o resto é retórica vazia.          
Sendo assim, pergunta-se: a geografia é uma ciência atual, ainda merece um lugar ao sol? Sim. Basta, em primeiro lugar, abandonar o pesado fardo, expresso no desejo obsessivo, de querer ser ciência. Pois, por mais que os geógrafos teimem na importância do espaço, no seu caráter pedagógico etc. para a sociedade, esta mesma sociedade insiste em não lhe dar importância alguma! O discurso geográfico deveria isto sim se justificar por si só mais pela questão urgente e fundamental das relações da sociedade e da natureza; ainda mais no momento atual, em que a natureza tornou-se uma categoria histórica. Outro ponto importante é o de retomar, ao desatar de uma vez por todas os laços cientificistas, as questões de ordem estéticas (Humboldt) na geografia, assim como a música, poesia, pintura etc. A ênfase na técnica, reflexo mais puro e acabado do niilismo, destruiu as nuances do grande estilo que permeavam o que havia de melhor no conceito de gênero de vida. Vejamos:

A mão do oleiro indígena, na Guiana assim como no Peru, molda a matéria ao sabor de sua fantasia e das suas necessidades. (...) Assim, através dos materiais que a natureza lhes fornecia, e, por sua vez, a despeito da rebelião ou da insuficiência, o homem procurou realizar certas intenções, fez arte. (...) Estas civilizações rudimentares, que nos reportam aos períodos arcaicos das nossas próprias civilizações, são já, não obstante, um ponto de chagada, um resultado de progresso, para os quais contribuem visivelmente a iniciativa, a vontade e o sentimento artístico. (LA BLACHE, pp. 275 e 276).
                                                                                        
            Este resgate jamais pode eclipsar a verdadeira vocação das ciências humanas, que é a de melhorar a sociedade. Por isso, a geografia não pode nunca deixar de ter um compromisso com a transformação radical da sociedade e deve trabalhar duro para mudar a vida das pessoas.

CONCLUSÃO

A geografia não é a ciência do espaço. Estabelecer o espaço como objeto da geografia é apenas uma questão terminológica e não resolve o problema da imprecisão conceitual que o termo remete, dada sua polissemia, tampouco outorga unidade metodológica de uma ciência específica. Afinal, que espaço? O Universo? A distância entre dois pontos? A essas perguntas, poderiam ser acrescentadas n outras. Logo, que espaço? O modo às vezes irrefletido com que é tratado o espaço na geografia suscita mais obscurecimento do que esclarecimento. Muitas vezes o espaço na geografia cumpre a mesma função de um código que só tem sentido dentro da corporação. Mas esta solução é puramente escolástica. As definições de espaço pela geografia são completamente idiossincráticas e jamais conheceram paralelo na história do pensamento filosófico e científico. Mas o pior é justamente quando se transpõe simplesmente uma definição da filosofia, da física, da matemática para a geografia sem a menor consideração crítica.
Isto significa que a geografia devia abandonar o conceito de espaço?  Sim e não. Durante muito tempo a geografia fez uso do termo espaço no sentido acrítico e naturalista de objetividade exterior. E não havia nada de errado com isso. O problema é que se perdia a dimensão dialética ao hispostasiar natureza e sociedade em esferas justapostas. A geografia também empregou o termo espaço no uso coloquial da linguagem, supondo sua inteligibilidade imediata. E também não havia nada de errado com isso. Mas quando, em nome da ciência, buscou-se definir espaço como objeto de estudo, a geografia caiu num obscurantismo, pois omitiu que o espaço de que trata a geografia é o espaço geográfico. Portanto, não é qualquer espaço. Todavia, não é um conceito em si, dissociado das definições correntes de espaço. É um espaço constituído historicamente, em relação à paisagem, e que data da constituição dos Estados-nacionais. Assim, é possível pensar a “matéria” do espaço em geografia como uma “substância geográfica”, expressão resgatada por Hartshorne. Todavia, se o espaço geográfico se torna abstrato e autômato, enquanto expressão da alienação e do fetiche, trata-se então não de afirmá-lo mas de aboli-lo.

BIBLIOGRAFIA:

COELHO, T. T. C., “Uma viagem na consciência ‘inconsciente’: modernização, geografia e relação sugjeito-objeto”, USP-FFLC-GEOG. Monografia (mimeo), 2013.

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[1] LACOSTE, Y., A geografia: isso serve, em primeiro lugar para fazer a guerra”, Campinas: Papirus, 2005.
[2] David Harvey (1980) explica a crise na geografia como uma insuficiência do paradigma neopositivista. Já Antônio Carlos Robert Moraes, em seu “Geografia: pequena história crítica” (2005), atribui ao referido livro de Yves Lacoste como desencadeador, pelo menos no Brasil, da Geografia Crítica.
[3] Longe disso: sem essa linguagem, a maior parte das analogias íntimas das coisas permaneceriam para sempre fora do nosso conhecimento; e teríamos sempre ignorado a harmonia interna do mundo, que é, como veremos, a única verdadeira realidade objetiva. A melhor expressão dessa harmonia é a lei. (POINCARÉ, 1995, p. 8).
[4] Um exemplo: a relação da indústria, do mundo da riqueza em geral, com o mundo político é um dos problemas fundamentais da era moderna. Sob que forma começa este problema a preocupar os alemães? Sob a forma de tarifas protecionistas, do sistema de proibição, da economia política. (...) Na Alemanha, portanto, começa-se agora a reconhecer a soberania do monopólio no interior do país, por meio da qual se confere ao monopólio a soberania exterior. Por conseguinte, na Alemanha começa-se agora, com aquilo que já terminou na França e Inglaterra. (MARX, 2013, p. 155). 
[5] Na Alemanha, nos escritos de Fichte e sobretudo nos de F. List,privilegia-se a economia nacional e, em consequência, avalia-se o protecionismo econômico sob uma luz mais favorável. Algumas décadas mais tarde, ainda na Alemanha, vários integrantes da chamada "escola histórica", com Schmoller em primeiro lugar, analisam o mercantilismo como tendo sido uma política econômica racional perfeitamente ajustada às necessidades de construção e fortalecimento dos Estados modernos, promovendo a unificação interna e assegurando o seu poder no confronto internacional. (FALCON, 1994, pp. 14 e 15).
[6] Quando a população atinge densidade considerável, o território consegue prover apenas às necessidades de uma pequena parte desta, enquanto a maior parte deve recorrer, para obter o alimento ou o vestuário a território estrangeiro, frequentemente situado a grandes distâncias. (...) para isso intervém o comércio. Mas a proteção destas comunicações cabe ainda ao Estado; a expansão política e semipolítica que se obtém através de colônias, leis alfandegárias, tratados de comércio, visa frequentemente este objetivo. (RATZEL, 1990, p. 79). 
[7] Aliás, a noção de “gênero de vida” foi formulada por Rousseau: “Tudo começa a mudar de face. Os homens, até então errantes nos bosques, tendo adquirido uma situação mais fixa, aproximam-se lentamente, reúnem-se em diversos grupos e formam, enfim, em cada região uma nação particular, unida pelos costumes e pelos caracteres, não por regulamentos e por leis, mas pelo mesmo gênero de vida e de alimentos e pela influência do clima” (J.-J. Rousseau, em A origem da desigualdade entre os homens).  “Tout commence à changer de face. Les hommes errants jusqu'ici dans les bois, ayant pris une assiette plus fixe, se rapprochent lentement, se réunissent en diverses troupes, et forment enfin dans chaque contrée une nation particulière, unie de mœurs et de caractères, non par des règlements et des lois, mais par le même genre de vie et d'aliments, et par l'influence commune du climat” (texto original) .
[8] Optamos por traduzir, apesar das dificuldades, a citação visando obter maior acessibilidade ao texto. No original: “Des nécessités, nulle part. Des possibilités, partout. L’homme et non plus la terre, ni les influences du  climat ni les conditions déterminates des lieux. (...) Nous l’avons dit et montré. De telles conceptions sont d’autant plus arbitraires que, lorsque nous parlons du modelage de vastes societés humaines par les conditions naturelles que l’analyse géographique nous révèle aujourd’hui, nous traitons en réalité, nous devrions traiter du modelage des hommes par le travail humain” (Idem, p. 285).
[9] O modernismo assumiu no período entre-guerras uma forte tendência positivista e, graças aos intensos esforços do Círculo de Viena, estabeleceu um novo estilo de filosofia que viria a ter posição central no pensamento pós-Segunda Guerra. O positivismo lógico era tão compatível com as práticas da arquitetura modernista quanto com o avanço de todas as formas de ciência como avatares do controle técnicos. Foi esse o período em que as casa e as cidades puderam ser livremente concebidas como “máquinas de viver”. (HARVEY, 1994, p. 39).
[10] Henri Lefebvre tem uma compreensão muito semelhante a esse respeito sobre o autômato, a cidade, o “cibernantropo”. Em nossa tese de doutorado “Ocupar, Resistir, Construir, Morar” (2012), fizemos uma longa discussão do tema no âmbito da produção do espaço.


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quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

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O primeiro semestre de 2016 fechou com um saldo negativo para as conquistas das mulheres. No cômputo geral, as mulheres sofreram dois grandes reveses: um, na política; outro, na sexualidade. Em ambos os casos, trata-se da costumeira violência contra a mulher... Ler mais

O 18 DE BRUMÁRIO DE MICHEL TEMER, O NANICO
“A história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Inicio este texto com uma das frases mais notáveis e, ao mesmo tempo, vulgares, tamanha a sua força retórica, da tradição humanista nas ciências. A frase é inspirada no clássico “O 18 de Brumário de Luís... Ler mais

Quando a geografia aspirou à condição de ciência, ao final do século XIX, emergindo daí a necessidade de constituir suas bases epistemológicas, duas tendências opostas nortearam, como um divisor de águas, projetos nacionais distintos, representados por duas escolas... Ler mais

Nos estudos de linguística um tema bastante interessante é o chamado gênero discursivo. O gênero discursivo pode ser caracterizado como um modo peculiar na fala e na escrita de um determinado grupo social. Um exemplo banal pode ser dado pelo uso da “mesóclise”. A gramática... Ler mais

A cibernética, entre os anos de 1940 e 60, concebeu uma teoria científica pela qual propunha uma analogia radical entre o organismo, a linguagem, a sociedade e a máquina (termostato). Em nosso ensaio “Atualidade da Geografia”, publicado em nosso blog, mostramos como... Ler mais

Abrimos com essa citação de Marshall McLuhan porque nos parece condizente com a hipótese da qual gostaríamos de defender neste pequeno artigo, a saber, a identificação de novos gêneros textuais condicionados pela evolução do aparato tecnológico das mídias eletrônicas... Ler mais

A meu ver, um dos maiores equívocos da história do pensamento geográfico foi ter atribuído à geografia o status de ciência positivista por excelência. Além do anacronismo evidente em tal associação (aliás, os geógrafos nunca conseguiram estabelecer ao certo o surgimento... Ler mais

KURZ CIRCUITO (HUMOR)
Após o Capitão Hegel ter ido para a reserva e sido substituído pelo Capitão Marx, agora era a vez do Capitão Kurz assumir o comando da Tropa Fetiche. Durante os severos treinamentos da tropa, o Capitão Kurz descobriu que um Trosko gabava-se de ter dado um salto... Ler mais

Os célebres acontecimentos aqui narrados referem-se à fantástica greve ocorrida no sistema solar quando da deliberação, por parte dos planetas telúricos, reunidos em assembleia extraordinária, realizada no ano de sete bilhões, trezentos e quarenta milhões, quinhentos mil, oitocentos... Ler mais

O título deste pequeno artigo recorda como militantes e simpatizantes das duas agremiações partidárias, PT e PSDB, se denominam, ofensiva e mutuamente, em seus ataques verbais e acusações que, quase sempre, ultrapassam os limites da “boa política” (se é que isso existe)... Ler mais

A referência histórica principal das origens do Dia Internacional da Mulher é a II Conferência Internacional das Mulheres Socialistas em 1910, em Copenhaga, na Dinamarca, quando Clara Zetkin propôs uma resolução para a instauração oficial de um dia internacional das mulheres... Ler mais

MÚSICA E GEOGRAFIA
É bastante lamentável a ausência, salvo engano, de pesquisas que relacionam música e geografia. Na produção acadêmica, pelo menos na Universidade de São Paulo, elas são raras – devido a aparente estranheza da temática musical aos estudos geográficos... Ler mais
Há algumas décadas, o geógrafo francês Yves Lacoste indagou a que fim servia, afinal, a geografia. Talvez, numa tentativa de resgatar a dignidade desta ciência, respondeu que a geografia, em primeiro lugar, está a serviço da guerra, em seu contundente livro de título homônimo... Ler mais

A SAGA DE UM ANDARILHO PELAS ESTRELAS:

Utopia pós-moderna, conta a história de um homem que abandona o planeta Terra e viaja pelas estrelas, onde conhece civilizações extraordinárias. Porém, o universo guarda infinitas surpresas e alguns planetas escondem perigos inesperados. O enredo é permeado de momentos cômicos que acompanham reflexões filosóficas sobre a existência e a vida. O livro é escrito em prosa, mas oito sonetos acompanham a narrativa. Livro de ficção; editora Multifoco... Ler mais



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