Mal o livro do
sociólogo Jessé Souza “A elite do atraso: da escravidão à lava jato” saiu do
prelo, a reação das elites não se fez por esperar, com a publicação de
“História da riqueza do Brasil”, de Jorge Caldeira. O lançamento do referido
livro não poderia ter sido mais bizarro: no televisivo Programa do Bial, e
contou com a aparição de uma das figuras mais sinistras do mundo universitário.
Quem? FHC. Elementar, meu caro Watson! O coronel tucano, que se tornou, graças
aos dólares da CIA, via Fundação Ford, o “príncipe da sociologia (sic)”... quer
dizer, “privataria”, foi convocado pelo intelectual de Big Brother... [pausa
para rir]... Pedro Bial, numa das situações mais insólitas e patéticas da
sociologia made in Brazil, para
referendar o tal livro como, em suas palavras, um “clássico”. (Em se tratando
de Fernando Henrique, melhor seria dizer crássico). Como se um livro se
tornasse clássico, de um dia para a noite, por decreto, e prescindisse do
debate intelectual, do tempo histórico, da repercussão acadêmica e social etc.
etc. etc. Curiosamente, assim como o livro de Jesse Souza, o de Caldeira também
se pretende revisionista, mas, sub-repticiamente, reforça todos os preconceitos
da literatura canônica que “A elite do atraso” joga por terra. Na verdade, a
“História da riqueza do Brasil” é uma total impostura. Nietzsche costumava criticar
a tendência moderna em que o estilo jornalístico torna-se modelo de professores
universitários como degeneração da cultura e da arte em entretenimento. Mas o
que diria o grande filósofo alemão do marketing substituir a pesquisa acadêmica?
É bem disso que se trata a “História da riqueza do Brasil”: uma obra de
marqueteiro. Primeiro, porque o autor trata a velha econometria como se fosse
uma grande novidade metodológica. Sim, o tal Jorge Caldeira relativiza a
exaustiva pesquisa documental e deduz suas conclusões de preguiçosos modelos
matemáticos e estatísticos. (Diga-se de passagem, nem os neoliberais da Escola
Austríaca dão qualquer crédito à econometria, facilmente manipulável). Daí em diante
tudo é permitido, como a singular afirmação de que os tupis eram empreendedores...
(Desculpem-me, mas vou ter de usar de um expediente adequado a tamanha, digamos
assim, trollagem: kkkkkkkkkkkkkkkkkk). Sim, pois, tais quais as inúmeras pérolas
de FHC, nas palavras do autor, “tecnicamente, um catador de papelão é um
empreendedor”. (kkkkkkkkkkkkk). Talvez, deva ter sido por isso que o
capitalismo desenvolvido no Brasil nunca vingou, haja vista que, após o
genocídio indígena, apenas 0,4 da população brasileira é atualmente composta
por estes arrojados empreendedores nativos que, suponha-se, graças à catequese jesuítica
(não a calvinista!), descobriram em si, no fundo de suas almas, o espírito
capitalista na fumaça do cachimbo do pajé. Mas o genocídio é apenas um detalhe
e racismo é tudo que não existe na sociedade brasileira, como todos nós,
obviamente, sabemos! Continuando, segundo Caldeira, no Brasil, desde tempos
imemoriais... sempre reinou a boa e velha democracia!... quer dizer, excetuando
o “Estado Novo” (Getúlio). A julgar por esta afirmação, o voto de cabresto e de
clientela é a mais pura definição de democracia e que Rousseau vai plantar
batatas! Depois destes e outros disparates, que Marx chamaria de robsonadas e
um historiador sério, anacronismos, o autor sustenta que, entre o fim do século
XIX e 1970, o Brasil foi o país que mais cresceu economicamente no mundo e
coloca todos os governos nacionalistas como responsáveis por desastres econômicos,
ou melhor, as figurinhas carimbadas de Jango, Geisel, Lula e Dilma. Elementar,
meu caro Watson! Na verdade, o livro de Caldeira segue a tradição que vai desde
Joaquim Nabuco, Barão de Rio Branco e, claro, FHC, e, portanto, apregoa uma
estreita dependência do Brasil aos EUA, sob o eufemismo de globalização. Outro
argumento interessante é a afirmação de que, enquanto o executivo sempre foi
instável, o parlamento sempre funcionou muito bem. Sem dúvida, com os milhões
de reais pelos quais cada parlamentar recebe à surdina para legislar em causa
própria e a favor da impunidade, nada poderia ser mais estável! Ora, se o executivo
é frágil e o parlamento é forte, então presidente para quê? Sim, se você pensou
no parlamentarismo, touché! Eis o programa completo do PSDB!!! Mas você deve
estar se perguntando quem é esse Jorge Caldeira – e eu também me fiz essa
pergunta – e a resposta, depois de muito procurar no Google, pode ser
encontrada num verbete de cinco linhas da Wikipédia. Aqui vai o principal sobre
o autor: “consultor do Projeto Brasil 500 Anos, da Rede Globo, editor-executivo
da Revista Exame, editor do Caderno Ilustrada e da Revista da Folha, do jornal
Folha de S. Paulo, editor de economia da Revista Isto É e editor da Revista do
Cebrap” (Fonte: Wikipédia). Viu? Só gente fina. Quanto ao Cebrap, de FHC, é o
caminho mais fácil para ser aprovado num concurso do prédio do meio... Ainda na
entrevista ao intelectual de Big Brother Bial, o tal Jorge Caldeira mostrou-se
alinhado com as reformas do governo Temer, e vangloriou-se por ter trabalhado
45 anos (o número não é apenas uma coincidência) e estar prestes a se aposentar
com 50, contribuindo religiosamente a previdência social. (Evidentemente, FHC,
em sua catedrática manifestação, omitiu o detalhe de que ele, FHC, se aposentou
aos 37 anos). Esta afirmação de Jorge Caldeira é mais uma de suas sandices.
Como se a atividade suave e bem remunerada de porta voz da mídia pudesse ser
comparada ao trabalho suado e mal remunerado de um trabalhador braçal da
construção civil, da metalurgia, da agroindústria canavieira, ou de motorista
do transporte coletivo, ou mesmo professor do ensino público etc., etc., etc. O
destino da miséria de a “História da riqueza do Brasil” já está traçado. Vai
parar ao lado dos crássicos de seu mestre FHC: ninguém lê.
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