Do dia 1 a 18 de março
de 1921, ocorreu um levante na base naval da Frota do Báltico, situada na
cidade-fortaleza de Kronstadt, fundada por Pedro I, na ilha de Kotlin, Golfo da
Finlândia, que entrou para a história da Guerra Civil na Rússia Soviética como
a “Rebelião de Kronstadt”.
Em 28 de fevereiro de
1921, em uma assembleia geral das equipes dos navios de guerra Sevastopol e Petropavlovsk, foi adotada uma resolução exigindo a reeleição do
conselho em Kronstadt (soviete) e reivindicado a remoção do Partido Comunista
Bolchevique do poder.
No dia 1º de março, uma
resolução foi aprovada por uma manifestação da guarnição e dos moradores da cidade
que se reuniram para comemorar o aniversário da Revolução de Fevereiro de 1917,
na Praça da Âncora, em Kronstadt.
Em 2 de março, foi
realizada uma reunião geral de representantes das tripulações de navios e
unidades do Exército Vermelho, na qual foi decidido a criação de um Comitê
Revolucionário Provisório (CRP), em Kronstadt, para organizar "eleições
livres e justas para um novo conselho" da cidade fortaleza.
No apelo lançado pelo
Comitê Militar Revolucionário, os bolcheviques foram acusados de serem
responsáveis pela ruína econômica, fome e frio no país, causando, por
conseguinte, agitação entre os trabalhadores de Petrogrado e Moscou. Com o
início do levante, cerca de 900 comunistas da guarnição de Kronstadt deixaram o
PCR.
O governo se recusou a
negociar com a guarnição insurgente de Kronstadt e, no dia 4 de março de 1921,
em nome do Comitê de Defesa de Petrogrado, foi lançado um ultimato, denominado
“Kronstadt enganada”, que exigia o fim da rebelião. Trotsky confiou a liderança
direta da operação militar ao comandante do Exército Vermelho Tukhachevsky.
A guarnição de Kronstadt
consistia de um efetivo de 17.961 homens, 134 canhões pesados, 62 canhões
leves, 24 canhões antiaéreos e 126 metralhadoras. Era uma força formidável
capaz de se defender com sucesso. Além disso, os participantes do levante
esperavam que “Makhno e Antonov insurgissem em seu apoio”, ou seja, dando
início de uma série de revoltas camponesas na Ucrânia e na província de Tambov.
Em contrapartida, sob o comando de Tukhachevsky, as forças reunidas eram bem
mais modestas - cerca de 11.000 pessoas, com 96 metralhadoras e 84 canhões.
O poder em Kronstadt
estava concentrado nas mãos do Comitê Revolucionário Provisório, formado por 15
veteranos e chefiado pelo escrivão sênior do encouraçado Petropavlovsk, Stepan
Maximovich Petrichenko, que demonstrava simpatia política aos Socialistas Revolucionários
de esquerda.
Segundo os
bolcheviques, a defesa de Kronstadt durante a revolta estava sob o comando do
Quartel-General da Fortaleza, supervisionado por especialistas militares,
incluindo o chefe da artilharia, o ex-major-general do exército czarista A.N.
Kozlovsky. Para o governo, a grande maioria dos comandantes e oficiais da
guarnição da fortaleza concordou em participar voluntariamente da rebelião.
O programa político do
levante foi formulado em 1º de março de 1921, através da resolução aprovada pela
reunião dos marinheiros dos encouraçados Petropavlovsk
e Sevastopol.
Possui 15 itens:
“1) Tendo em vista que
os sovietes não expressam mais a vontade dos operários e camponeses, requer-se
a realização imediata de eleição para os sovietes por voto secreto e
campanha preliminar livre com a
participação de todos os operários e camponeses.
2) Liberdade de
consciência e de imprensa para operários, camponeses, anarquistas e partidos
socialistas de esquerda.
3) Liberdade de reunião
e de associação camponesa e sindical.
4) Convocação de uma
conferência não partidária de operários, camponeses, soldados do Exército Vermelho
e marinheiros das montanhas, de Kronstadt e de Petrogrado e província, até 10
de março de 1921, o mais tardar.
5) Libertação de todos
os presos políticos de partidos socialistas, bem como todos os trabalhadores e
camponeses, soldados do Exército Vermelho e marinheiros envolvidos em
movimentos operários e camponeses.
6) Eleição de uma
comissão para analisar os casos de prisioneiros em campos de concentração.
7) Abolir todos os
departamentos políticos, pois nenhum partido pode gozar de privilégios para
propagar suas ideias e receber fundos do Estado em sua própria causa. Em vez
disso, estabelecer comissões culturais e educacionais eleitas localmente, para
as quais os fundos devem ser alocados pelo Estado.
8) Remoção imediata de
todos os destacamentos de estradas (blitz).
9) Uniformizar as
porções de ração para todos os trabalhadores, com exceção daqueles que exercem
atividade insalubre nas oficinas de alto risco.
10) Abolir os
destacamentos de combate comunista em todas as unidades militares, bem como em
fábricas e usinas; se tais destacamentos forem necessários, no entanto, estes
podem ser designados para unidades militares de empresas, fábricas e usinas,
seguindo critérios estipulados por trabalhadores.
11) Pleno direito de
usufruto dos camponeses sobre suas terras e também o gado, salvo em caso de uso de mão de obra
assalariada que está proibida.
12) Pedimos a todas as
unidades militares, bem como aos colegas cadetes militares, para que apoiem à
nossa resolução.
13) Exigimos que todas
as resoluções sejam amplamente divulgadas na imprensa.
14) Nomeação de uma
agência de inspeção para controle.
15) Permitir a livre
produção de artesanato por meio de mão de obra própria e não assalariada.
O significado geral do
programa da guarnição rebelde era o de rejeitar a política do “comunismo de
guerra”. Ao mesmo tempo, no bloco econômico, a maioria dos requisitos não
contradizia com as novas diretrizes econômicas – a NEP – que já havia sido
aprovada pela liderança bolchevique nas vésperas do X Congresso do PCR. Mas a
parte política do programa estava permeada pela aspiração de apear os bolcheviques
do poder. O lema “Todo poder aos sovietes, não aos partidos” tornou-se o
principal slogan do movimento de Kronstadt.
Tendo em vista a
escassez de alimentos, a CRP estabeleceu normas fixas para a distribuição
diária de alimentos.
O primeiro assalto à
fortaleza teve início em 7 de março de 1921. O ataque falhou devido à rendição
do batalhão do 561º regimento, que participava da ofensiva. Em 10 de março,
unidades da 27ª divisão, com obuses e artilharia pesada, foram transferidas da
Frente Ocidental. No dia 17 de março iniciou-se um novo assalto e a queda da
fortaleza. Uma parte significativa dos rebeldes, incluindo a maioria dos
membros do Comitê Militar Revolucionário, deixou Kronstadt através do Golfo da
Finlândia, evadindo-se para a Finlândia.
As perdas das tropas
soviéticas totalizaram 3 mil e 143 pessoas; enquanto as perdas dos rebeldes
ultrapassaram mil pessoas.
Três mil “participantes
ativos na rebelião” foram presos, alguns dos quais condenados à morte, outros a
cinco anos de trabalhos forçados e cerca de um terço deles foi libertado ou
condenado a um ano de serviço comunitário em liberdade condicional. Os
encouraçados rebeldes foram renomeados: o Sevastopol
se tornou “Comuna de Paris” e o Petropavlovsk,
"Marat".
O Presidente da Rússia
baixou um decreto datado de 10 de janeiro de 1994, nº 65: “Sobre os eventos em
Kronstadt na primavera de 1921”. Segundo o documento, os participantes do
levante foram reabilitados e foi tomada a decisão de erguer um memorial para
todas as suas vítimas.
A memória histórica registrou o levante de Kronstadt como um símbolo de ideais da aspiração por uma sociedade livre e de autogoverno, de um sistema de poder desprovido de conteúdo político-partidário e da liberdade própria da revolução russa como um todo.
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