quarta-feira, 1 de abril de 2020

MARCO POLO A CAMINHO DA CHINA – OUTRA VEZ


Todos os caminhos parecem levar a Roma. Itália manifesta o mais puro amor pela Iniciativa Cinturão e Estrada (ICE).

por Pepe Escobar

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga

O presidente Xi Jinping é esperado na Itália em visita oficial, dia 22 de março. Principal tema de discussão será a Nova Rota da Seda, ou a Iniciativa Cinturão e Estrada (ICE).

Um dia antes, em Bruxelas, a União Europeia deve debater uma estratégia comum relacionada aos investimentos chineses na Europa.

Parte substancial da União Europeia já está conectada de facto com a ICE. Incluem-se nisso Grécia, Portugal, 11 nações da União Europeia que constituem o Grupo 16+1, de China plus Europa Central e Oriental e, para todas as finalidades práticas, Itália.

E ainda assim, quando uma subsecretária no Ministério de Desenvolvimento Econômico da Itália, Michele Geraci, disse ao Financial Timesque durante a visita de Xi será assinado um memorando de entendimento de apoio à ICE, o inferno (Casa Branca) desabou sobre o mundo.

O FT não se acanha de opinar pesadamente, e apresenta a ICE como "discutível programa de infraestrutura" [ing. contentious infrastructure program]. A Iniciativa Cinturão e Estrada é projeto vasto, de longo alcance e longo prazo de integração da Eurásia, pode-se dizer, o único programa de desenvolvimento quase global que há no mercado, qualquer mercado. É especialmente "discutível" no caso de Washington – porque o governo dos EUA, como detalhei noutro artigo, decidiu trabalhar contra o programa, em vez de tratar de lucrar com ele.

Um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca tentando zombar da ICE ("iniciativa made by China, para proveito da China") não facilita as coisas. Se fosse projeto tão daninho, nada menos que 152 países e organizações internacionais – e o número continua a aumentar –, já não teriam apoiado formalmente a ICE.

A resposta semioficial da China à Casa Branca, diferente das expressões diplomáticas de sempre do Ministério de Relações Exteriores, veio num editorial mordaz, não assinado, publicado no Global Times ["Se Europa continua a seguir as loucuras dos EUA, todos perdem", traduzido no Blog do Alok], que acusa a Europa de deixar-se submeter à política exterior dos EUA e a uma aliança transatlântica senil, que não corresponde às suas reais necessidades no século 21.

Geraci diz o óbvio: o elo com a ICE permitirá que mais produtos Made in Italy sejam exportados para a China. Como alguém que vive entre Europa e Ásia, sempre discute a ICE quando na Itália, vejo exatamente isso o tempo todo. O apelo do Made in Italy para o consumidor chinês – comida, moda, arte, design de interiores, para nem falar daqueles Ferraris e Lamborghinis – é fantásico, maior, até que o apelo das marcas francesas. Turistas chineses amam Veneza, Florença e Roma, querem sempre mais. Como também amam fazer compras em Milão.

Washington nada conseguirá com sua ladainha de que a ICE obra contra os EUA na guerra comercial – dado que, seja como for, pode ser iminente algum tipo de acordo Xi-Trump. E Bruxelas, por seu lado, já está profundamente dividida, especialmente por causa da França.

O business alemão sabe que a China é o mercado preferencial, presente e futuro; além do mais, um dos principais terminais da Nova Rota da Seda é Duisburg, no vale do Ruhr.

Estamos falando da conexão Yuxinou para trem de transporte de contêineres, ferrovia de cerca de 11 mil km, ativa desde 2014; Chongqing, Cazaquistão, Rússia, Belarus, Polônia, direto até Duisburg. Yuxinou (sigla de Chongqing-Xinjiang-Europa), um dos corredores chaves das Novas Rotas da Seda, deve passar por upgrade que o converterá em ferrovia para trens de alta velocidade na próxima década.

Há quase um ano, expliquei com algum detalhe em Asia Times o modo como a Itália já está conectada à ICE.

Essencialmente, trata-se da Itália – 3ª nação europeia em comércio marítimo – já configurada como o principal terminal do sul da Europa, na ICE; porta de entrada para rotas de conectividade que vêm o leste e do sul, ao mesmo tempo em que também serve, de modo custo-efetivo, a quase incontáveis destinos no oeste e norte.

Absolutamente chave no projeto é a atual modernização do porto de Veneza – canalizando linhas de suprimento que vêm da China, pelo Mediterrâneo, para Áustria, Alemanha, Suíça, Eslovênia e Hungria. Veneza está sendo reconfigurada como superporto alternativo a Rotterdam e Hamburgo – que também são conectadas à Iniciativa Cinturão Estrada. Chamei de a Batalha dos Superportos.

Independentemente do que Washington, a City de Londres e inclusive Bruxelas possam pensar, tudo isso é assunto que Roma – e Milão – identificam como questão de interesse nacional italiano. E considerando o imorredouro caso de amor que liga os chineses com todas as manifestações de Made in Italy, o ganha-ganha mais uma vez ganha.*******

Pepe Escobar, Asia Times, 9/3/2019

Fonte: Blog do Alok

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